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Tratamento da Fístula Anal

O que são as fístulas anorretais?

As fístulas anais ou anorretais são comunicações anormais que surgem entre os músculos do esfíncter do ânus e o meio externo ou outras áreas da pelve. De um modo bem simples, são “canaletas” com um orifício interno, outro externo e um trajeto fistuloso, formado por tecido inflamatório e fibrose.

 

Anatomia da região anal

A região anal  guarda uma série de particularidades que são importantes quando tratamos as doenças anorretais. Por exemplo, temos o aparelho muscular esfincteriano, que é formado, a grosso modo, por duas camadas musculares em forma de cilindro:

  • O esfíncter anal interno, que é formado por fibras musculares lisas, que têm seu funcionamento independente do controle voluntário e auxilia na continência fecal de repouso e que RELAXA durante a evacuação;
  • O esfíncter anal externo, formado por fibras musculares estriadas, que recebem inervação somática e que temos maior controle durante o ato evacuatório.

Entre esses músculos e a mucosa, existem espaços de tecido conjuntivo, que são preenchidos por nervos e vasos sanguíneos. As hemorroidas internas, por exemplo, são coxins vasculares que se localizam abaixo da mucosa do canal anal e acima da musculatura interna.

Por mais complexos que pareçam, esses conceitos são importantes porque norteiam os cuidados que devemos ter durante as cirurgias anais.

Como surgem as fístulas anais?

A teoria mais aceita para o seu surgimento é a da origem criptoglandular: acredita-se que a obstrução e infecção das chamadas glândulas de Chiari (presentes numa área do canal anal entre os músculos interno e externo e ao nível da linha pectínea) levaria a um processo inflamatório que dissecaria os espaços entre esfíncteres e tecidos do assoalho pélvico.

Algumas estatísticas falam em até 30 a 50% de chances de um abscesso evoluir para uma fístula, tamanha a incidência dessa doença. Há quem considere, inclusive, que abscessos e fístulas são fases diferentes de uma mesma doença.

Adaptado de Cleveland Clinic

Há ainda outras causas menos comuns de fístulas anorretais, mas que devem ser levadas em conta em casos de apresentação atípica, recidivante ou complicada. Como exemplo, podemos citar:

– Infecções sexualmente transmissíveis (IST’s)

– Doença Inflamatória intestinal (principalmente a doença de Crohn Perianal)

– Hidradenite supurativa

– Irradiação perineal prévia (como em pacientes com câncer de próstata ou do colo uterino)

– Tuberculose

– Lesões traumáticas e cirurgias anais prévias

 

Quais os principais sintomas de quem tem fístula anal?

O sintoma mais comum das fístulas anais é a saída de secreção por um orifício próximo ao ânus, como se fosse uma “espinha”. Essa secreção pode ser sanguinolenta, amarelada ou mesmo ter odor fétido.

Há ainda, situações de descarga purulenta através do próprio canal anal, que pode ocorrer associada ou não às evacuações. Esses sintomas podem cessar espontaneamente, ou – mais comumente – cronificarem, com períodos de remissão intercalados com períodos de atividade.

Podem ainda surgir outros sintomas como:

– Dor anal

– Febre baixa

– Sensação de nodulação ou de um “cordão fibroso” junto ao ânus.

– Incontinência fecal

– Saída de fezes por outros locais (na urina ou na vagina) – em casos de fístulas complexas com a uretra, bexiga ou vagina.

O surgimento ou suspeita da existência de qualquer um desses sintomas requer atenção especial e exame proctológico para definição diagnóstica.

 

Como diagnosticar as fístulas anorretais?

O primeiro passo é a realização do exame físico. Nele, tanto na inspeção, quanto através do toque retal e da anuscopia, podemos visualizar os orifícios fistulosos e até sentir o canal da fístula – percebido como um cordão fibroso ao toque.

Em uma boa parte dos casos, quando há certeza diagnóstica de fístula anorretal e o exame físico sugere que o trajeto é simples, podemos inclusive partir para um “exame sob anestesia” em que o paciente é levado para o centro cirúrgico, recebe anestesia e sedação e tem a região perianal examinada com o auxílio de instrumentais cirúrgicos.

Porém, em casos em que há dúvida diagnóstica, nas recidivas das fístulas, ou quando consideramos que o trajeto possa ser complexo, além do exame físico, podemos realizar uma tomografia de pelve ou – preferencialmente – uma ressonância magnética de pelve para entendermos melhor os trajetos das fístulas. A ultrassonografia endoanal também pode ser uma opção.

 

Classificações das fístulas anorretais

 

Aqui abordaremos alguns conceitos um pouco mais específicos. Se você achar que está muito complexo, pode seguir direto para o tópico de tratamento, mas as definições aqui apresentadas também ajudam a nortear o modo como tratamos as fístulas anorretais.

 

De acordo com a “Regra de Goodsal-Salmon”, podemos utilizar a localização dos orifícios externos das fístulas para predizermos seus trajetos e orifícios internos: fístulas posteriores tendem a ter trajeto curvo, com orifício interno geralmente junto à linha média posterior. Já as fístulas anteriores teriam trajeto reto e em posição radial (como os ponteiros de um relógio). A exceção seriam as fístulas longas, de trajeto maior que 3cm, que também drenam para a linha média posterior. Essa regra é muito útil na caracterização intraoperatória das fístulas.

Modelo esquemático da Regra de Goodsall-Salmon para identificação do trajeto das fístulas anais

 

Podemos ainda diferenciá-las através da Classificação de Parks (1961), que leva em conta as estruturas acometidas no trajeto da fístula. Assim, temos:

  • Interesfincterianas (mais comuns – 45% casos): acometimento apenas do esfíncter interno e do espaço interesfincteriano. Ocorrem mais frequentemente porque, sendo um espaço formado apenas por tecido conectivo, oferece menor resistência à dissecção pela inflamação e infecção.
  • Transesfincterianas (30% casos): acometimento dos esfíncteres interno e externo; Estas são importantes porque, tendo maior acometimento muscular, são as de maior risco para incontinência fecal durante o tratamento.
  • Supraelevadoras (20%): o trajeto da fístula “poupa” o esfíncter externo ao dissecar acima do músculo elevador do ânus
  • Extraesfincterianas (5%): fístulas mais complexas, com múltiplos trajetos, podendo inclusive ser “em ferradura”.

 

Uma terceira classificação, mais prática, divide as fístulas em simples ou complexas. As fístulas simples seriam superficiais ou interesfincterianas, com acometimento menor que 30% do aparelho muscular esfincteriano. Já as fístulas complexas seriam aquelas com trajetos múltiplos e longos, com alto risco de incontinência se abordadas em tempo único.

 

Tratamento das fístulas anorretais

Dois princípios básicos guiam o tratamento das fístulas anorretais:

  1. Por se tratar de inflamação crônica, as fístulas demandam um tratamento intervencionista. O simples uso de medicações não costuma surtir efeito para sua resolução
  2. Preservar o esfíncter anal o máximo possível é mandatório! Ressecções agressivas podem levar a incontinência fecal, que deve ser evitada.

 

Com isso em mente, podemos pensar nos principais tratamentos dessa doença. Fístulas mais simples são candidatas a uma fistulotomia, com abertura do trajeto da fístula e curetagem (uma raspagem do tecido inflamatório), ou fistulectomia, em que ressecamos todo o tecido inflamatório que compõe a lesão.

Porém, nem sempre isso é possível. Em casos mais complexos, diante do risco de incontinência, temos de lançar mão de outras técnicas, como:

  • Fistulectomia em 2 tempos: na primeira cirurgia identificamos o trajeto e ressecamos o máximo de tecido inflamatório. Depois, passamos sedenhos cortantes (fios de algodão ou seda) amarrando o esfíncter interno para conduzirmos fibrose local e um mecanismo de “contenção” da musculatura. Numa 2a cirurgia revisamos o trajeto e, caso necessário, seccionamos o músculo fibrosado de um modo que isso gera menor repercussão à função do músculo, para que surja uma cicatriz única e sem trajetos inadequados
  • LIFT: Ligadura do trajeto transesfincteriano (ligation of the intersphincteric fistula tract): nessa técnica, dissecamos o espaço entre os músculos dos esfíncteres anais interno e externo, até acharmos o “tubo” de inflamação da fístula. Seccionamos o mesmo e separamos a comunicação entre os orifícios interno e externo, para permitir uma cicatrização da inflamação.
  • Retalhos mucosos: geralmente utilizada em casos mais complexos ou recidivados. Nessa técnica, ressecamos o tecido da fístula e – no local onde ficaria sua abertura interna, cobrimos com um “tapete” de mucosa sadia que trazemos das áreas mais internas do canal anal.
  • Outras técnicas: há ainda procedimentos desenvolvidos mais recentementes, que modificam alguma das técnicas já mencionadas. Por exemplo, temos a FILAC: Fistulectomia anal com laser (fistula tract laser closure), em que após cateterização do trajeto, há uma cauterização interna com laser; o VAAFT: Ligadura do trajeto fistuloso assistida por vídeo (vídeo assisted anal fistula treatment), em que diminutas ópticas endoscópicas são inseridas nos trajetos fistulosos para os estudarmos melhor, ou mesmo o uso de colas de fibrina e plugs de colágeno, que visam a preencher e selar os trajetos fistulosos.

 

Existem ainda as situações em que coexistem as fístulas e os abscessos anais. Nesses casos, optamos somente pela drenagem ampla do abscesso e cateterização do trajeto fistuloso com os chamados sedenhos não-cortantes (nelatons ou vessel-loops, por exemplo), que funcionam como drenos até melhora do processo inflamatório.

 

Conclusões

Como você pode ver, há uma série de formas para tentarmos tratar as fístulas anorretais e nem sempre conseguimos realizá-lo num tempo só. Ter um profissional em que você confie e que tenha experiência no manejo das fístulas e de eventuais complicações é fundamental para obtermos sucesso terapêutico.

Ficou alguma dúvida? fale conosco!

Esse texto tem como objetivo principal informar pacientes. Caso tenha dúvidas ou sugestões, entre em contato através do email contato@fabioisrael.com .

 

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